ela estava sentada perto da janela, estava escuro, mas eu
podia ver suas lágrimas. chovia uma chuva rasa e serena. ela olhava pela janela
com uns olhos furtivos. procurando algo. escondi-me nas sombras. queria observar. queria que ela ficasse. queria que o tempo parasse.
pisquei.
ela não estava lá. junto de suas lagrimas a chuva também se
foi. sai do meu esconderijo e olhei pela janela aonde eu pude ver as estrelas
no seu escuro. minha garganta secou. o tempo estava seco. senti saudades. queria
ela aqui, mais uma vez, comigo.
virei meu rosto e olhei para a sala vazia, sem vida. fechei meus
olhos e senti o cheiro de laranjas. como ela sempre cheirava laranjas. a principio
eu destetava esse cheiro. laranjas. por que, raios, ela cheirava laranjas? sorri
e senti o sal da lágrima. abri os olhos e olhei fundo dentro dos dela. parada na
minha frente. olhando para mim. aqueles olhos. tão negros, tão profundos, tão
indiferentes. como ela podia ser tão mesquinha? como eu não conseguia parar de
pensar nela? ou melhor, por quê? fechei meus olhos. senti a respiração dela
contra a minha. senti seu cheiro. laranjas. ainda com os olhos fechados dei
dois passos a frente. não senti nada. abri meus olhos e rapidamente andei até a
cozinha. água. precisava de água. abri a geladeira, peguei o copo, o enchi e
bebi. a cozinha estava escura e virado para o escuro vi com o canto do olho ela
encostada à porta. pare de me assombrar! gritei. tateei o balcão da cozinha, mas não parei de encara-la. apoiei o copo. não o
soltei. ela olhou para mim e sorriu. um sorriso triste. apertei o copo com
força e o atirei nela. ele explodiu contra a parede escura. voou vidro e
água. estava escuro e vazio. sorri. tristemente.